domingo, 9 de maio de 2010

Visão de um neto:

Nas noites de lua cheia, eu sempre fiquei acordado espiando o rio, espiando a lua que se espelha no rio, na esperança de ver ao menos o vulto do velho, um velho que foi morar no rio, aqui mesmo nesse rio, que passa no trapiche de nossa casa. E isso não é história inventada, foi ocorrido de verdade, saiu até em papel de jornal na época.
A história é assim: há muito tempo, um homem mandou fazer uma canoa, sem porque nem pra que. Quando a canoa ficou pronta, sem ninguém saber o motivo, ele se embrenhou no meio do rio. A esposa e os filhos (dois homens e uma mulher), de tudo fizeram pro velho voltar, mais o velho nunca voltou.
Meu pai morreu cedo, mas era ele quem me contava essa história e eu nunca esqueci. Ele também sempre falava que muito aprendeu com esse velho. Esse velho era pai do meu. A minha vó por parte do velho, meus tios e meu primo, eu nunca conheci, foram simbora daqui pra nunca mais.
Ontem, no meio da noite, vi um velho numa canoa, alí na beira. A noite tava um breu, mas posso assegurar que aquele velho era o meu avô. Eu senti isso!
Hoje é a última noite que passamos aqui. Minha mãe não aguenta mais a solidão. Vamos pras bandas da minha avó de mãe, num outro rio, que corre bem longe daqui.
Tinha uma música que meu pai sempre cantava, que era assim:
Meu pai vai.

Foi a canoa no rio
Foi nosso pai que partiu
Foi a canoa sumindo
Na groa do mato, o mato do rio

Rio de beleza e encanto
Por que tens que trazer tanta dor?
Rio que me dá de comer e beber
Traz de volta o meu pai por favor

Na beira do rio, na beira do rio
Beirando o rio, meu pai vai
Na beira do rio, na beira do rio
Beirando o rio, meu pai vai

Foi pai que ensinou a pescar
Foi pai que ensinou a nadar
Foi pai que ensinou a remar
Por pai aprendi a rezar


Foi pai que ensinou a pescar
A nadar, a remar, aprendi a rezar

Na beira do rio, na beira do rio
Beirando o rio, meu pai vai
Na beira do rio, na beira do rio
Beirando o rio, meu pai vai

Vai, vai, singrando, remando
Vai, vai, traz meu pai
Pai, pai, mistérios que eu canto
Pai, pai, meu pai vai.

Aldo Pessoa de Figueiredo.

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